Abalados, moradores tentam se adaptar às incertezas após a tragédia
Publicado em 26/02/2022 - 09:30 Por Vladimir Platonow - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro
Passados 11 dias da tragédia que assolou Petrópolis e que tirou a vida de pelo menos 217 pessoas, a preocupação dos sobreviventes passa a ser onde morar. Nos primeiros dias que se seguiram ao temporal de 15 de fevereiro, a maioria buscou abrigo na casa de parentes, de amigos ou em abrigos - que nesta sexta-feira (25) reuniam 889 pessoas, em 13 pontos de apoio.
Porém, com o passar do tempo, a busca passou a ser por um endereço próprio, pois dividir o espaço com estranhos ou mesmo familiares não é algo fácil, por causa do aperto ou do comportamento dos outros, o que muitas vezes acaba gerando atritos.
No Morro da Oficina, é grande o número de pessoas subindo e descendo as ladeiras, trazendo nas mãos sacolas com o pouco que restou de suas vidas, objetos e peças de roupas localizados dentro dos imóveis que não foram abaixo, mas que não têm mais condições de segurança, por estarem à beira de barrancos, com as paredes rachadas ou em frente a enormes buracos que se abriram no chão.
Testemunhos da tragédia
“Eu estava em casa com a minha filha e chovia muito. Eu escutei um estrondo e vi aquela avalanche de lama. Nós corremos para o quarto e ficamos presos lá, tentando sair. Quando quebrei uma telha, vi que não tinha mais morro. Graças a Deus tivemos a vida preservada, mas o recomeço é muito difícil. Perder tudo é complicado. Estou na casa da minha sogra e agora é aguardar essa saga do aluguel social. Eles falaram que vão dar, mas não disseram o dia. Dão um número de telefone que só chama até cair”, relatou Rosilane Amaral da Silva.
Sentada à beira do caminho onde antes havia sua casa, junto do marido, Jaime, motorista de aplicativo, eles foram pegar algumas coisas que pudessem carregar, como roupas e objetos pessoais, antes que a casa caísse em definitivo, pois ficou à beira do barranco que se formou, quando o morro veio abaixo. “A única coisa que minha filha pediu para trazer é uma caixa de fotos antigas”.
Situação semelhante vive a família de Marisa Pereira, que ficou com a casa preservada, mas teve a mãe soterrada no deslizamento, atingida na casa de uma vizinha, no Morro da Oficina.
Em outra parte do morro, a aposentada Maria José subia com dificuldade a imensa escadaria que leva à parte alta, procurando a sombra de um muro para descansar.
“Eu estou perdida, um desespero só. No dia que caiu isso tudo, parecia que tinha vindo um furacão. Todo mundo que eu conhecia está morto, tudo debaixo dessa terra. Morreu tudo. Eu estava em casa e vi quando desceu. Minha neta perguntou o que era e eu disse que o céu estava caindo. Vi a tragédia passar pela minha janela. Essas imagens não saem da minha cabeça. É uma coisa horrível. Agora estou na casa de uma amiga. Eu quero voltar para a minha casa. Mas não sei o que vão fazer comigo. O pessoal não deixa eu voltar”, disse ela, que morava há 45 anos no local.
A prefeitura de Petrópolis foi procurada para se manifestar sobre o andamento dos processos de aluguéis sociais, mas não se pronunciou até a publicação da matéria.
Donativos
Em uma grande tenda armada na rua em frente ao Morro da Oficina, milhares de peças de roupas e centenas de pares de calçados são disputados por moradores atingidos pela tragédia. Alguns ficaram sem nada, apenas com a roupa do corpo. Outros tentam pegar algo para entregar a parentes ou amigos, igualmente atingidos.
“Eu perdi tudo. Caiu, desmoronou. Todos se salvaram, pois saímos rápido. Agora estou na casa de uma prima. Estou procurando roupas, mas sapato ainda não consegui. Até agora ninguém falou de aluguel social. Eu não quero mais morar aqui, pretendo ir embora. É muita lembrança ruim de Petrópolis”, disse a aposentada Sandra Viana, que trouxe o filho para ajudar.
Cães farejadores
Enquanto isso, no alto do Morro da Oficina, o trabalho dos bombeiros e socorristas continuava na busca de desaparecidos. Com a ajuda de cães farejadores e informações de parentes, eles formavam grupos, atuando em determinadas áreas onde era provável a localização dos corpos.
As equipes são guiadas pelo faro dos cães da corporação, alguns vindos de outros estados. É o caso dos bombeiros catarinenses Thiago Amorim, com a cadela Moana, de Itajaí, e Guilherme Galli, com o cão Sasuke, de Lages, ambos animais da raça Labrador.
No total, são 50 duplas de homens e cães, incluindo equipes dos estados de São Paulo, Bahia, Minas Gerais e Santa Catarina e das cidades fluminenses de Magé, Teresópolis e Rio de Janeiro.
Cenas impactantes
Alguns bombeiros chegaram horas depois da tragédia, no meio da noite, vindos do Rio de Janeiro, em apoio às equipes locais, e estavam praticamente trabalhando sem cessar desde então, com raras folgas para o descanso.
Fonte: Agência Brasil
Edição: Pedro Ivo de Oliveira
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